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Gago Coutinho (1869-1959)
Podemos dividir a actividade de Gago Coutinho em quatro áreas, que se sucedem cronológicamente enquanto áreas de actuação prioritária: marinha, sobretudo de 1893 a 1898, trabalhos geográficos, entre 1898 e 1920, navegação aérea, de 1919 a 1927, e história da náutica e dos descobrimentos, de 1925 a 1958.
O seu primeiro embarque prolongado foi na corveta Afonso de Albuquerque, de 7 de Dezembro de 1888 a 16 de Janeiro de 1891, em viagem para Moçambique e na Divisão Naval da África Oriental. Desta corveta passou à canhoneira Zaire, na qual esteve até 24 de Abril de 1891, viajando para Lisboa. Colocado na Divisão Naval da África Ocidental, embarcou sucessivamente na lancha-canhoneira Loge, que comandou, na canhoneira Limpopo, na canhoneira Zambeze, e na corveta Mindelo. Em serviço nesta corveta no Brasil em 1894 contraiu a febre amarela, pelo que foi internado no Hospital da Beneficência Portuguesa no Rio de Janeiro. De novo na Metrópole, esteve embarcado na canhoneira Liberal e na corveta Duque da Terceira. Fez nova viagem no Atlântico Norte na corveta Duque da Terceira. Viajou até Moçambique no transporte Pero de Alenquer e depois passou à corveta Rainha de Portugal, e em seguida à canhoneira Douro, que o trouxe para Lisboa. Embarcou depois na corveta couraçada Vasco da Gama, até 31 de Março de 1898, da qual transitou para a sua primeira comissão de geógrafo ultramarino, em Timor.
Desde Março de 1898 a maior parte da actividade de Gago Coutinho desenvolveu-se no âmbito da Comissão de Cartografia, nascida em 1883, primeiramente em trabalhos de campo de delimitação de fronteiras ou de geodesia processados em Timor, Moçambique, Angola, e S. Tomé, e a partir de 1919 como vogal, passando a presidir aos seus destinos em 1925, até à sua transformação na Junta de Investigações do Ultramar, em 1936.
Entre 27 de Julho de 1898 e 19 de Abril de 1899, Gago Coutinho esteve envolvido em trabalhos de campo, na delimitação de fronteiras de Timor e no levantamento da carta deste território. De regresso à metrópole, foi nomeado para a delimitação de fronteiras no Niassa, trabalho que decorreu entre 5 de Setembro de 1900 e 28 de Fevereiro de 1901. Partiu depois para Angola, onde se dedicou à delimitação da fronteira de Noqui para o rio Cuango, até fins de 1901. Em seguida trabalhou na delimitação de fronteiras no distrito de Tete, em Moçambique, entre 27 de Fevereiro de 1904 e 18 de Dezembro de 1905.
Foi nomeado chefe da Missão Geodésica da África Oriental, nela tendo trabalhado durante cerca de 4 anos, de Maio de 1907 até ao início de 1911. Foi nesta missão que conheceu Sacadura Cabral, com quem travou amizade e que viria a ser o mentor dos projectos futuros de navegação aérea. Em seguida foi escolhido para chefiar a missão portuguesa de delimitação da fronteira de Angola no Barotze, a qual só se constituiu definitivamente em 1912. Regressando à metrópole em 1914, foi nomeado em 1915 chefe da Missão Geodésica de S. Tomé.
Os seus trabalhos ao serviço da Comissão de Cartografia, foram interrompidos apenas pelos períodos em que esteve embarcado nas canhoneiras Sado na India e Pátria em Timor, de Setembro de 1911 a Agosto de 1912, e de Março de 1922 a Dezembro de 1923, quando da travessia aérea Lisboa-Rio de Janeiro.
Em meados de 1919, quando terminava os trabalhos relativos à missão geodésica de S. Tomé, Gago Coutinho, incentivado por Sacadura Cabral, começou a dedicar-se ao progresso dos métodos de navegação aérea. Tinham voado pela juntos pela primeira vez em 1917. Sacadura Cabral planeara já a viagem aérea ao Brasil, que pretendia fazer por altura da comemoração do centenário da independência desse país, em 1922. Gago Coutinho passou então a dedicar-se à resolução dos problemas que se punham à navegação aérea sem pontos de referência à superfície. Para experimentar os processos de navegação aérea em estudo, Sacadura Cabral e Gago Coutinho fizeram diversas viagens juntos, incluindo a primeira viagem aérea entre Lisboa e Funchal, em 1921, aperfeiçoando deste modo os métodos de observação em desenvolvimento. Estes estudos culminaram em 1922 com a realização da viagem aérea entre Lisboa e o Rio de Janeiro.
Foi membro de diversas associações científicas, entre as quais a Academia das Ciências, a Academia Portuguesa de História, a Sociedade de Geografia de Lisboa e várias Sociedades de Geografia do Brasil.
Actividade Científica O que celebrizou Gago Coutinho foi o seu trabalho científico pioneiro na navegação aérea astronómica e a realização, com Sacadura Cabral, da primeira travessia aérea do Atlântico Sul, entre Lisboa e o Rio de Janeiro. A partir do momento em que voou pela primeira vez com Sacadura Cabral, em 1917, Gago Coutinho tentou resolver os problemas que se punham à navegação aérea astronómica. Colocava-se o problema da dificuldade de definição da linha do horizonte a uma altura normal de voo. A dificuldade em efectuar medições precisas de posição em situação de voo com um sextante vulgar colocava problemas de natureza instrumental e metodológica.
Em colaboração com Sacadura Cabral concebeu e construiu um outro instrumento a que chamaram «Plaqué de abatimento» ou «corrector de rumos», que permitia calcular graficamente o ângulo entre o eixo longitudinal da aeronave e o rumo a seguir, considerando a intensidade e direcção do vento.
Para comprovar a eficácia dos seus métodos e instrumentos, Gago Coutinho e Sacadura Cabral fizeram várias viagens aéreas, entre as quais uma viagem Lisboa-Funchal, em 1921, em cerca de sete horas e meia. Nesta viagem, Gago Coutinho executou 15 cálculos de rectas de altura e várias observações da força e direcção do vento.Segundo escreveu, os processos de navegação utilizados eram os suficientes para demandar com exactidão qualquer ponto afastado da terra, por pequeno que fosse, recurso este que se tornava muito essencial numa projectada viagem aérea de Lisboa ao Brasil. A viagem que finalmente demonstrou a todo o mundo o valor destes instrumentos e métodos foi a travessia aérea do Atlântico Sul, entre Lisboa e o Rio de Janeiro, entre 30 de Março e 17 de Junho de 1922.
Após esta viagem e as subsequentes homenagens e recepções oficiais, Gago Coutinho continuou a trabalhar na Comissão de Cartografia e passou a dedicar grande parte da sua atenção à história das viagens do descobrimento dos séculos XV e XVI, tendo publicado muitos textos em que analisava os métodos utilizados e procurava explicar como conseguiram os portugueses realizar as navegações a longa distância e ver terra nos séculos XV e XVI. A partir das suas experiências de navegação à vela em diversos navios em que prestou serviço procurou explicar como os portugueses utilizavam já então os métodos mais adequados para fazer face aos ventos e correntes contrárias.
Fez viagens em que praticou a observação com astrolábio semelhante aos que usavam os portugueses no século XV, comparando os seus resultados com os obtidos em sextantes e cronómetros com auxílio de sinal de rádio. Destes estudos concluiu que a experiência dos navegadores portugueses da época dos descobrimentos foi determinante para possibilitar a navegação astronómica, e que as viagens eram devidamente planeadas a partir da experiência e que as suas rotas de regresso não eram fruto das tempestades e outros imprevistos, como defendiam alguns historiadores. São de destacar os seus estudos sobre o regime de ventos e correntes no Atlântico Norte, que obrigava os navegadores portugueses a contornar pelo mar largo as correntes e ventos contrários, no regresso da Guiné ou da Mina. Esta manobra, chamada volta da Guiné ou volta da Mina, e que Gago Coutinho habitualmente chamava volta pelo largo, começou a ser praticada em meados do século XV, sendo no início do século XVI uma navegação de rotina.
Fernando Reis
Muitos outros textos foram publicados em dois volumes editados por Teixeira da Mota: Obras completas de Gago Coutinho, Lisboa, Junta de Investigações do Ultramar, 1972.
BOLÉO, José de Oliveira, Gago Coutinho e Sacadura Cabral, Lisboa, Sociedade de Geografia, 1972. CORRÊA, Pinheiro, Gago Coutinho, Precursor da Navegação Aérea, Porto, Portucalense Editora, 1969. Correia, José Pedro Pinheiro, LEMOS; Carlos M. Oliveira e, O Almirante Gago Coutinho, Lisboa, Instituto Hidrográfico, 2000. REIS, Manuel dos, CORTESÃO, Armando, Gago Coutinho Geógrafo, Coimbra, Junta de Investigações do Ultramar, 1970, sep. de Memórias da Academia das Ciências de Lisboa, Tomo XIII, 1969.
Raid Aéreo Lisboa-Rio de Janeiro 1922-2002
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© Instituto Camões 2003 | ||||||||||||||