João Mendes Sachetti Barbosa (1714-1773/4?)
Nasceu em Estremoz e estudou Filosofia em Évora e Medicina na Universidade de Coimbra, onde se destacou como o melhor aluno de então na Faculdade de Medicina. Praticou medicina em Estremoz e Campo Maior até se estabelecer em Elvas, a partir de 1743. Nesta cidade foi nomeado médico do Hospital Real, posição que já detinha em Campo Maior.
Devido a dificuldades financeiras em virtude de ter poucos pacientes no exercício da medicina privada e sendo o seu vencimento no Hospital reduzido [ganhava então 6$000 reis (6 mil)], concorreu ao cargo de familiar do Santo Ofício, tendo sido para ele nomeado em 1756.
Dois anos mais tarde era médico da Casa Real e da Câmara do Infante D. Manuel e cavaleiro e fidalgo da Casa Real. Em 1759 foi feito cavaleiro da Ordem de Cristo e em 1762 nomeado Físico-Mor do Exército durante a guerra de 1762. Em 1763 caiu em desgraça e foi demitido da sua posição depois de ter estado preso durante quatro meses e meio.
Obras
Considerações Médicas Sobre o Método de Conhecer, Curar e Preservar as Epidemias, Endemias e Febres Malignas Podres, Pestilenciaes, Contagiosas, e Todas as Mais, Que se Compreendem no Titulo de Agudas, a Cujos Respeitos Se Trata do Uso e Abuso de Todos os Remedios Notaveis da Nossa Presente Pratica, principalmente Leites, Soros e Caldos de Frangos por ordem ao Clima de Portugal, e a Vulgar Opinião que Muitos Tem sobre o de Lisboa e os das Provincias. Aplicadas particularmente às que se Seguem nos Grandes Terremotos, como o do Primeiro de Novembro de 1755, e aos Meteoros e Fenomenos Terraqueos, Que o Precederão, Acompanharão e Se Lhe Seguirão. Escritas em tres cartas e hum Apendix ao Dr. *** por João Mendes Sachetti Barbosa, medico do numero da Caza Real de S. Magestade Fidelissima, da Camara do Serenissimo Senhor Infante D. Manoel, e dos Serenissimos Senhores D. Antonio, D. Gaspar e D. José, Socio das Regias Sociedades de Londres e Academias Medicas de Madrid. Parte I, Lisboa, 1758. Esta parte, única que se publicou, só contém as 1ª e 2ª cartas, faltando a 3ª e o apêndice.
Neste seu livro Considerações Medicas ocupa-se do tratamento e profilaxia das epidemias e febres contagiosas, que considerava um grande perigo em consequência do terramoto de 1755. A medicina para ele deve ser baseada no sistema de Boerhave (1668-1738), que por sua vez é fundado no sistema filosófico de Newton (1642-1727). Na primeira carta tenta demonstrar que as epidemias e febres contagiosas são precedidas de fenómenos naturais, como sejam estações, terramotos, inundações, meteoros celestes, cadáveres em putrefacção ao ar livre, mudanças de hábitos de vida e paixões deprimentes, como o susto e o terror. Noutra carta procura conciliar a medicina antiga com o sistema de Boerhave no que respeita ao conhecimento, profilaxia e tratamento das doenças contagiosas; fixar o carácter das febres que procedem de irregularidade das estações e das que procedem da inquinação do ar pelos produtos da putrefacção, seguindo estas considerações de uma crítica ao método curativo empregado em Lisboa no tratamento das febres. As opiniões de Barbosa foram refutadas por Duarte Rebello de Saldanha (?-?), na sua obra Illustração Medica (...).
Cartas em que se dá notícia da origem e progresso das ciências, escritas ao doutor José da Costa Leitão por um seu amigo e dadas à luz pelo mesmo para utilidade dos curiosos, Lisboa, 1753. Estas cartas fazem parte da longa polemica suscitada pelo aparecimento da obra O verdadeiro método de Luís António Vernei (1713-1792), e foram também atribuídas ao religioso Frei José de S. Miguel (1714-?).
Há ainda algumas referências a outros escritos de Barbosa que carecem de confirmação quanto ao autor e que se referem ao terramoto de 1755, suas causas e efeitos, a doenças e febres e promovendo a medicina de Boerhaave.
Principais contributos científicos
Sachetti Barbosa nunca saiu do país, mas são de realçar as relações que estabeleceu com sociedades científicas estrangeiras e com os médicos emigrados mais prestigiados do tempo. Em 1747 era membro da Real Academia Médica de Madrid. Iniciou correspondência com Jacob de Castro Sarmento (1691?-1762) e António Nunes Ribeiro Sanches (1699-1782) anteriormente a 1748 e 1750, respectivamente. Era também sócio, a partir de 1755, da Royal Society de Londres. A sua correspondência com Sarmento só terminou com a morte deste em 1762, após o que passou a corresponder-se com Emanuel Mendes da Costa (1717-1791), bibliotecário da Royal Society de Londres, com o qual manteve contactos epistolares entre 1763 e 1765. Quanto a Ribeiro Sanches, as boas relações entre ambos terminaram em 1772 com divergências quanto à reforma dos estudos médicos em Portugal. Quando, em 1749, foi fundada no Porto a Academia Médica Portopolitana, por Manuel Gomes de Lima (1727-1806), Sachetti Barbosa foi encarregado de fazer a"Oração Académica Inaugural". Entre os sócios da Academia, há vários que terão aderido por via do próprio Sachetti, entre os quais Ribeiro Sanches, Castro Sarmento, vários médicos alentejanos e também Fr. Pedro Néri, da Congregação do Oratório e boticário do Convento de Estremoz, na altura, juntamente com Barbosa, um dos representantes das Águas de Inglaterra enviadas de Inglaterra por Castro Sarmento.
Segundo Frei Manuel do Cenáculo (1724-1814), presidente da Junta de Providência Literária, corroborado por Ribeiro Sanches, Sachetti Barbosa colaborou activamente na reforma dos estudos médicos e terá sido o autor dos novos estatutos da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Sachetti Barbosa foi um dos fabricantes portugueses da Água de Inglaterra. O início do fabrico terá sido posterior a 1748, data em que representava as águas de Sarmento em Elvas e terá acabado em 1762, com a guerra e a sua desacreditação.
Fernando Reis
Bibliografia
DIAS, José Pedro de Sousa, A Água de Inglaterra no Portugal das Luzes, contributo para o estudo do papel do segredo na terapêutica do século XVIII, Lisboa, 1986, [trabalho apresentado para a prestação de provas de aptidäo pedagógica e capacidade científica na Fac. Farmácia da Univ. de Lisboa - texto policopiado].
LEMOS, Maximiano de, História da medicina em Portugal: doutrinas e instituições, 2ª ed., Lisboa, D. Quixote - Ordem dos Médicos, 1991.
SILVA, Inocencio da, ARANHA, Brito, Diccionario Bibliographico Portuguez, Lisboa, Imprensa Nacional, T. III, pp. 420-421.
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