Espaço Atlântico de Antigo Regime

Espaço Atlântico de Antigo Regime

Documents

A acção da justiça e as transgressões da moral em Minas Gerais - Mariana 1747-1820


Edna Mara Ferreira da Silva
Universidade Federal de Juiz de Fora


Pretende-se através das fontes criminais observar as soluções encontradas para os mais diversos conflitos entre os habitantes de Mariana, primeira cidade das Minas Gerais. Tais soluções muitas vezes se distanciam das regras do sistema legal vigente no período colonial. Mariana encontra-se em posição privilegiada para estudos sobre moral e sexualidade do período colonial em Minas, sendo sede de bispado, estava, pois sob a acção e influência do tribunal eclesiástico, bem como das instâncias normatizadoras das autoridades civis. Acreditamos que os processos-crime são uma fonte riquíssima que nos permite perceber alguns dos valores aceitos pela sociedade. Além disso, o crime pode ser uma indicação de uma maneira própria de entender o conjunto das normas escritas ou sociais. Dessa forma, esse estudo orienta-se no sentido de realizar uma análise das tensões e interseções entre os modelos formulados a partir dos valores dominantes e os diferentes padrões sócios culturais disseminados na sociedade mineira dos setecentos.

A administração portuguesa no espaço atlântico: a Mesa da Inspecção da Bahia (1751-1807)


Teresa Cristina Kirschner
Universidade de Brasília


A criação das Mesas da Inspecção da Agricultura e Comércio em algumas capitanias da colónia portuguesa da América, em 1751, é o resultado da administração pombalina, cuja prioridade era reestruturação da economia do império por meio de um maior controle e fortalecimento do comércio, segundo os princípios mercantilistas. As Mesas da Inspecção tinham como objectivo controlar a qualidade dos principais produtos de exportação, fiscalizar seus preços e combater o contrabando.
O paper acompanha a trajectória da Mesa da Inspecção da Bahia desde a sua criação até 1807, quando o príncipe regente D. João VI solicitou um parecer à Câmara de Salvador sobre a conveniência ou não da sua conservação. O exame das actividades da Mesa da Inspecção da Bahia nesse período revela a orientação ilustrada de alguns dos seus funcionários, as tensões entre plantadores e negociantes provocadas pela própria expansão da economia exportadora no final do século e as dificuldades que a administração colonial encontrou para resolvê-las por meio dos métodos tradicionais da política mercantilista.

A boa administração da justiça


Cláudia Damasceno Fonseca
Universidade de Paris III - Sorbonne Nouvelle


Ao ser implantado na América, o sistema político-territorial português sofreu algumas modificações devido a uma necessária adaptação às condições geográficas e sociais locais. No caso de Minas Gerais, que examinaremos nesta comunicação, uma das diferenças mais notáveis diz respeito à escala das unidades territoriais (concelhos, julgados, comarcas) que se formaram na capitania ao longo do século XVIII: algumas dessas circunscrições eram tão extensas que podiam abranger todo o território do Portugal continental. Como procuraremos demonstrar, uma das consequências desta hipertrofia territorial foi a transformação das atribuições e da jurisdição dos juízes ordinários e vintenas, sobretudo daqueles situados nas zonas mais remotas da capitania.

A capitania de Pernambuco e a instalação da Companhia Geral do Comércio


Érika Simone de Almeida Carlos Dias
Universidade Federal de Pernambuco


O trabalho proposto versa sobre a instalação da Companhia Geral de Comércio na capitania de Pernambuco, ocorrida durante a segunda metade do século XVIII, partindo de um repertório de fontes, cuja problematização se centrou na imposição do projecto pombalino de Companhias de comércio para o Nordeste brasileiro durante o reinado de D. José I. Reinado que se notabilizou pela centralização do poder, modernização dos órgãos de governo e uma melhor exploração das colónias através de reformas administrativas e do reforço do monopólio. E como a companhia foi uma instituição de carácter mercantilista, criada como peça vital no conjunto reformista aplicado por Pombal neste período, tendo como um dos objectivos salvaguardar os interesses metropolitanos e reafirmar o comercial com o Brasil, serve o seu estudo para ajudar a compreender tão agitado período da História comum aos dois lados do Atlântico, e parte da estratégia pombalina para reerguer a economia do Reino, que se deu também através do aperfeiçoamento dos mecanismos de controlo sobre a sua rica colónia na América.

A Companhia de Jesus e a Inquisição: afectos e desafectos entre duas instituições influentes [...]


José Eduardo Franco
CEPCEP - Universidade Católica Portuguesa


O tema desta comunicação pretende ser a primeira síntese de um trabalho de investigação mais vasto que estamos a desenvolver sobre as relações entre a Companhia de Jesus e o Tribunal do Santo Ofício no século XVI-XVII em Portugal, no Brasil e no Oriente. Muita historiografia e literatura do século XIC e XX herdeira das polémicas antije­suíticas pombalinas apresentam-nos uma visão desfocada, porque fortemente radicalizada, da relação entre Jesuítas e a Inquisição. A corrente antijesuítica procurou acentuar a relação estreia, de intimidade mesmo, entre esta instituição judicial e os Padres da Companhia. O seu trabalho concertado entre estas duas instituições teria sido responsável pela decadência de Portugal e das suas colónias. Para rebater esta visão radicalizada par efeitos polémicos, a historiografia apologética filojesuítica procurou, por seu lado, acentuar a clivagem entre estas duas instituições, acentuando os antagonismo e as confrontações registadas entre ambas, numa perspectiva apologética-revisionista da história dos Jesuítas.
Distanciando-se destas visões desfocadas da história por razões ideológicas, a nossa conferência pretende de uma forma crítica e interpretativa analisar%% à luz de documentação publicada e inédita, o percurso das relações entre estas duas poderosas instituições ao longo de dois séculos. Com efeito, tanto em Portugal, como no Brasil e no Oriente assiste-se a situações de cumplicidades e, ao mesmo tempo ou em períodos diferentes de confrontações entre membros da Companhia e o Santo Ofício.

A conflitualidade social e institucional em São Tomé ao longo do século XVI


Luís da Cunha Pinheiro
Centro de História de Além-Mar - Universidade Nova de Lisboa


A conflitualidade é uma marca indelével que perpassa por toda a história de São Tomé. Os conflitos entre os diversos grupos sociais e populacionais, bem como entre os diversos pólos de poder, quer religiosos, quer político-administrativos, perpetuaram-se ao longo dos séculos.
Para a concretização do seu povoamento recorreu-se a dois grupos populacionais distintos, o europeu e o africano. O primeiro era constituído por uma grande variedade de indivíduos, os homens livres, os degredados e algumas crianças judias, e o segundo pelos escravos resgatados na costa africana e por alguns africanos livres. Apesar dos europeus serem minoritários dominavam a sociedade, dispunham de meios e recursos financeiros e controlavam o poder administrativo e económico.
Resultante da miscigenação incentivada, desde os primeiros tempos, pela coroa surgiu um terceiro grupo, o dos mulatos ou pardos. Estes foram, progressivamente, desempenhando um papel cada vez mais interventivo e importante na sociedade santomense, nomeadamente ao nível económico. Mas não eram reconhecidos socialmente e a sua parti­cipação na administração era restrita. Ao serem discriminados muitos procuravam, pela força, alterar essa situação. Desde os primeiros tempos que a coroa incentivou o cultivo da cana-de-açúcar. Os trabalhos associados a esta cultura e à produção do açúcar eram realizados pelos escravos nas fazendas e nos engenhos. Os conflitos entre os escravos e os seus senhores eram os mais comuns, traduzindo-se na resistência, na fuga para o mato, em revoltas, na destruição das plantações e na morte dos senhores ou dos seus representantes.
Para além dos trabalhos desenvolvidos nas fazendas os escravos eram também uma importante força para os seus senhores, que os utilizavam para impor a sua força política e para se oporem às autoridades administrativas. De acordo com Jácome Leite os escravos eram a «principal cousa nesta terra» pelo que «posto um homem na sua fazenda ou no mato fica quase isento de todas as leis». Para além dos conflitos atrás referidos existiam também os de cariz institucional, envolvendo todas as autoridades da ilha, os governadores, a Câmara, o ouvidor, o bispo e o cabido. Eram causados essencialmente por questões de ingerência de jurisdição e de cariz económico-financeiro, pois todos procuravam a melhor forma de enriquecer. Perante tamanha animosidade as revindictas pessoais eram comuns, a autoridade contestada por todos e a estrutura administrativa caótica.

A construção do passado em História Geral do Brasil


Helena Mollo
Universidade Federal de Tocatins


Na elaboração de História geral do Brasil, seu autor, Francisco Adolfo de Varnhagen, se debruça sobre o passado e elabora cerca de quatro séculos de história para o País ainda recentemente formado. Os três primeiros séculos da história do Brasil são tratados, nesta obra, sem que seu autor caracterize cada um deles através de suas especificidades temáticas, dando-lhes o contorno de período de formação, para que então acontecimentos do Oitocentos tenham lugar. Contudo, a escolha pela periodização, em primeiro lugar, e pelos assuntos tratados neste período de tempo, em segundo, faz com que as escritas anteriores sobre o Brasil apareçam como as principais fontes desta obra.
O objectivo da presente comunicação é analisar como são desenhados, em História geral do Brasil, os séculos precedentes à Independência e qual a leitura do historiador oitocentista sobre os cronistas que lhe antecedem.

A contenção e o excesso: bebida, embriaguez e identidades étnicas no Brasil holandês (1630-1654)


João Azevedo Fernandes
Universidade Federal Fluminense


Durante o período do domínio holandês no Brasil (1630-1654), dois sistemas coloniais de poder se chocaram, com consequências políticas cruciais para a história luso-brasileira. No seio deste conflito, diferentes modos de vida e diversas configurações culturais também entraram em choque, e isto fica patente quando se comparam as formas pelas quais os luso-brasileiros e os neerlandeses consumiam as bebidas alcoólicas e como viviam a experiência da embriaguez. Os documentos e relatos do período são bastante explícitos quanto ao fato de que os dois lados se identificavam com distintos regimes etílicos, distinções que se construíam em torno de noções de contenção" e de "excesso", e que permitiam aos contendores situarem-se, étnica e culturalmente, em um contexto extremamente dinâmico, e profundamente afectado pela situação colonial.
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A derradeira expansão da fronteira: a conquista «definitiva» dos Sete Povos das Missões - 1801


Elisa Fruhauf Garcia
Universidade Federal Fluminense


Em 1801, os Sete Povos das Missões situados na margem oriental do rio Uruguai foram incorporados definitivamente à América portuguesa. Aproveitando-se da conjuntura de guerra europeia, alguns súbditos do Rei Fidelíssimo atacaram os Sete Povos e os anexaram ao Rio Grande de São Pedro. Com esta anexação, a Capitania do Rio Grande mais que duplicou as suas dimensões territoriais, adquirindo, grosso modo, seus contornos actuais. Além dos ganhos territoriais, também foram incorporados cerca de 14.000 vassalos à Coroa portuguesa e um património em rebanhos e benfeitorias bastante considerável. No entanto, segundo os relatos da época, foi a grande adesão dos missioneiros que tornou possível esta mudança de soberania. Nesta comunicação, pretendo enfocar os motivos que levaram os índios a desejarem esta mudança, abordando como se deram os relacionamentos entre estes e os colonos luso-brasileiros, pois esta \\\"conquista\\\" foi fruto mais de acordos e de diálogos, do que de enfrentamentos bélicos directas.

A escrita jesuítica da história das missões no Estado do Maranhão Grão-Pará (século XVII)


Célia Cristina da Silva Tavares
Universidade do Estado do Rio de Janeiro


Apesar de por vezes ser contraditória, a acção missionária ao norte da colónia portuguesa na América se fez a partir da experiência malograda do ciclo litorâneo, cuja maior lição tinha sido o reconhecimento da necessidade de afastar as missões dos núcleos coloniais e não apenas isolar os indígenas nas aldeias, como ocorreu no século XVI.
O ciclo maranhense (século XVII) pode ser definido como uma espécie de ressurgimento da acção missionária na colónia. A grandiosidade da região amazónica e a abundância de indígenas que lá viviam justificavam os esforços e dificuldades enfrentados pelos missionários.
A presente comunicação pretende estudar a construção da prática missionária jesuítica no Estado do Maranhão e Grão-Pará, a partir da análise da Crónica da missão dos padres da Companhia de Jesus no Estado do Maranhão, do jesuíta João Felipe Bettendorf, importante figura que assumiu vários cargos, tais como superior da Missão (1668 a 1674 e 1690 a 1693) e reitor do colégio do Maranhão (1674).

A exegese de Vieira na constituição do Quinto Império: a história reordenando as coisas do reino


Jaqueson Luiz da Silva
Universidade Estadual de Campinas


A História do Futuro do padre António Vieira, como se sabe, tem sua composição efectuada enquanto responde ao processo na Inquisição, cuja causa são as proposições censuradas na carta Esperanças de Portugal. Se entendermos que a causa principal deste processo é a proposição de que haverá um Quinto Império estabelecido a partir do reino de Portugal, é necessária uma sua definição, pois pressupomos que antes não há em sua obra tal definição, quer dizer, antes do embate dialéctico com os inquisidores não há qualquer definição da dita Quinta Monarquia em sua obra, sendo o que a parece ser, nada mais que apenas tópicos da ortodoxia católica efectuando outros sentidos de acordo ao género - sermão, cartas, papéis políticos -que os comporta. Então, de acordo ao uso conveniente do género história, Vieira reordenando os fatos do Reino - Descobrimentos, Restauração, guerras contra os holandeses na Bahia, entre outros ­actualiza, por meio da alegoria factual, a história portuguesa apresentando, pois, o Quinto Império.

A formação da elite colonial nas partes do Brasil através da conquista territorial (sécs. XVI-XVII)


Rodrigo Ricuperto
Universidade de São Paulo


No século XVI, uma parcela importante da elite colonial foi formada através da participação na administração directa ou indirecta da colónia. Nesse período de conquista e consolidação da costa atlântica, entre São Vicente e Belém do Pará, cada etapa de avanço serviu para o fortalecimento da elite colonial em formação, que se firmou aproveitando a possibilidade de ocupar novas terras, de adquirir escravos indígenas e de ocupar novos cargos.
Assim ter-se-ia dois movimentos - o de formação da elite colonial e o de conquista e consolidação da fachada atlântica - paralelos e complementares. E dado que a necessidade de defesa do território recém conquistado exigia o povoamento e a instalação de uma estrutura produtiva pode-se apontar que a dinâmica colonial, nos moldes do chamado Antigo Sistema Colonial, estruturou-se nessa etapa. Procuraremos em nossa comunicação comprovar tal dinâmica a partir da análise dos casos da conquista do Rio de Janeiro em 1560-65, da Paraíba em 1584, de Sergipe d'El-Rei em 1587 e da Costa leste-oeste (do Rio Grande ao Pará) entre 1598 e 1614.

A fronteira dos impérios: conexões políticas, conflitos e interesses portugueses na região platina


Maria Fernanda Bicalho
Universidade Federal Fluminense


Desde a fundação da Colónia do Sacramento em 1680, a região meridional da América tornou-se alvo de intensa disputa militar e diplomática entre os países ibéricos.
Durante a Guerra de Sucessão, a Espanha invadiu e ocupou o presídio. Compelida pelo Tratado de Utrecht, foi obrigada a reconhecer o direito de soberania lusa em Sacramento. Na década de 1740 iniciaram-se as negociações diplomáticas que resultariam na assinatura do Tratado de Madrid. A Guerra dos Sete Anos afectaria mais uma vez a disputa luso-espanhola pelas fronteiras de seus domínios na região platina. Em 1777 forças espanholas conquistaram definitivamente a Colónia do Sacramento. O objectivo desta comunicação é analisar tais conflitos e suas conexões com as redes e interesses imperiais no Atlântico Sul, a partir da correspondência de governadores de Sacramento, governadores e vice-reis no Rio de Janeiro e do Conselho Ultramarino. A sua principal hipótese é a da indiscutível centralidade da administração do Rio de Janeiro sobre os territórios e interesses meridionais da América.

A Igreja e a sociedade seiscentista no Brasil


Maria Madalena Larcher
Instituto Politécnico de Tomar


Se o império português viu desenrolar-se, sob um cenário geográfico multicontinental, diversos modelos sociais, que se entroncam, sob alguns aspectos, nas coordenadas gerais da sociedade portuguesa de então, mas que são verdadei­ramente inovadores no que toca à adaptação às peculiaridades locais, do meio físico e humano, da economia e arti­culação de poderes, também a pluralidade marca, neste campo, a realidade do Brasil.
O Brasil é, pois, um terreno importante para o estudo da complexidade das estruturas sociais do império português do século XVII, estruturas que é necessário abordar sob diversos prismas, mas principalmente sob dois: sociológico e jurídico, integrando em ambos, face à realidade da metrópole, o peso das categorias étnicas. É concretamente na especificidade de cada região que importa analisar os aspectos vários, tais como o da mobilidade social, os critérios de prestígio as elites ou ainda os preconceitos, nomeadamente os sócio-religiosos. A importância desigual dos diversos sectores da Igreja manifesta-se, neste contexto, mais um aspecto de relevo e de interesse na conjugação da história social com a história económica e política, ao enquadrarem-se os critérios de cada sociedade na evolução que aí assumiu a articulação de poderes, civis e eclesiásticos, eplo rei, simultaneamente o máximo representante do Estado e o administrador da própria Igreja, em brazão do Padroado. Em tempos de afirmação do absolutismo, as tensões internas entre o Estado e a Igreja, e no seio dos diversos sectores que os compõem, não podem deixar de transbordar, trazendo às vivências quotidianas os ecos da realidade do tempo, da América e da Europa, nas características da estratificação social, nos distintos discursos de poder, nas marcas das mentalidades.

A Insurreição Pernambucana de 1645


José Gerardo Pereira
Faculdade de Letras - Universidade de Lisboa

A Restauração da independência de Portugal ocorre numa conjuntura internacional complexa, em plena Guerra dos Trinta Anos, em que o rei português D. João IV tinha de apoiar-se nos inimigos da Espanha- os estados protestantes, entre os quais a Holanda- e também na França, dividida entre o catolicismo e o protestantismo.
Logo em Janeiro de 1641 são iniciadas as negociações com a França, de Richelieu, que se concluem em 1 de Junho com o Tratado Luso-Francês. No mesmo mês, Portugal e as Províncias Unidas celebram um Tratado de aliança ofensiva e defensiva contra a Espanha e um acordo de tréguas por dez anos nas suas colónias. Mas, aproveitando-se das tréguas, e antes que a ratificação das mesmas pelo Rei de Portugal se publicassem no Brasil, Maurício de Nassau, por incumbência da Companhia das Índias Ocidentais, manda ocupar Sergipe e Maranhão.
Esta quebra do tratado causou alarme em Lisboa, e no Brasil provocou fortes reacções que levaram à eclosão da revolta do Maranhão em Setembro de 1642. Dois anos depois, Maurício de Nassau embarcava, de regresso à Holanda e, em pouco tempo, tornou-se notória a falta  do seu espírito moderador em Pernambuco, quando crescia o movimento conspiratório.
O governo holandês, com sede no Recife, governava Pernambuco desde 1630, e a sua acção vinha a tornar-se opressiva para a população, não apenas pelo confisco de engenhos de açúcar, mas também pelas diversas imposições de ordem económica, fiscal e política que se sucediam. As difíceis condições de vida dos moradores foram narradas por autores do século XVII, alguns dos quais foram testemunhas de factos.
Com o agravamento da situação em Pernambuco, o movimento dirigido por João Fernandes Vieira assume a conjura contra o poder holandês, num compromisso de honra assinado em 23 de Maio de 1645 por dezoito moradores insurgentes. Os Estados Gerais das Províncias Unidas reagem exigindo a Portugal o cumprimento da trégua e, então, o Rei ordena a suspensão da luta iniciada pelos insurgentes pernambucanos. [...]

A limpeza de sangue e a escrita genealógica dos dois lados do Atlântico: alguns aspectos


João Figueirôa Rêgo
Centro de História de Além-Mar - Universidade Nova de Lisboa


Se a importância dada ao estatuto da pureza de sangue invadiu todos os estamentos e ordens sociais, a verdade é que foi no domínio da escrita genealógica e da nobiliarquia, em si mesma, que ela se revestiu de maior impacto gerando, até, casos de expressiva dramaticidade (o episódio Puritano, o processo 16 899 da Inquisição de Lisboa, etc), e de desonesta actividade (a falsificação da genealogia do padre Anchieta e outras).
A escrita genealógica, quer se apresentasse sob a forma de pareceres, certidões, árvores de costados ou no formato de nobiliário, assumiu inquestionável peso no entretecer da malha social do Antigo Regime protagonizando episódios vários de sublimação aristocrática ou, ao invés, fomentando clivagens e roturas, por exemplo, no patrocínio dado aos Tições (nobiliários negros), verdadeiro espaço" de conflitualidade a cuja influência não escaparam, sequer, velhas casas da nobreza histórica."

A mulatice como impedimento de acesso ao «Estado do Meio»


Isabel Mendes Drumond Braga
Faculdade de Letras - Universidade de Lisboa


Desde meados do século XVI, que a tripartição da sociedade em clero, nobreza e povo deixara de ser operativa. A teorização sobre a sociedade, a redefinição do conceito de nobreza e a criação do chamado estado do meio", com o consequente alargamento dos estados limpos, foi uma realidade que se foi impondo. A mobilidade social ascendente foi possível a todos os que não sendo nobres, mas tendo sangue limpo, andando a cavalo e tendo criados serviam ofícios ou artes consideradas nobres e consequentemente superiores às dos plebeus. Isto é, a expressão "estado do meio" poderia compreender os que não detinham nobreza hereditária, não descendiam de judeus, mouros, negros, mas que se situavam acima dos mecânicos e que, pela arte a que se dedicavam e tipo de vida que levavam, não poderiam ser entendidos como baixos ou vis.

A natureza africana na obra de Giovanni António Cavazzi


Carlos Almeida
Departamento de Ciências Humanas - Instituto de Investigação Científica Tropical


No desbravamento dos caminhos do espaço atlântico, a realidade natural constituiu-se, desde o início, como um tópico fundamental. O olhar sobre a paisagem, o encontro com novas formas de vida, animais ou plantas, ocupou sempre um lugar importante nos relatos, cartas e crónicas que documentam este período histórico. Testemunhos mais ou menos mediatizados do confronto com essas novas realidades, esses registos difundiram-se por toda a Europa e alimentaram a curiosidade intelectual e os debates científicos que aí se travavam sobre o corpo de conhecimentos designado como História Natural.
No contexto da África Central, a obra de Giovanni Antonio Cavazzi da Montecuccolo, Istorica descrittione de'tre regni Congo, Matamba, et Angola, situati nell' Etiopia inferiore occidentale e delle Missioni Apostoliche esercitateui da religiosi capuccini..., destaca-se como a mais significativa no esforço do homem setecentista, europeu e católico, para conhecer a realidade natural e humana da região em apreço. Ora, a atenção sobre a paisagem não vive isolada do olhar sobre os homens que a habitam e que constituem a razão primeira da acção missionária. Na verdade, o discurso sobre a natureza do continente desenvolve-se em articulação com uma representação particular do homem africano e reforça os aspectos essenciais de um olhar que o remete para um tempo sem história. Esta comunicação propõe-se reflectir sobre o discurso acerca da realidade natural na obra de Giovanni Antonio Cavazzi e as suas implicações na imagem do homem e das sociedades africanas que aí é construída.

A Secretaria de Governo da capitania de Pernambuco como parte do aparelho burocrático colonial


Josemar Henrique de Melo
Universidade Federal de Paraíba


O presente trabalho faz parte da tese de doutoramento que estuda a Secretaria de Governo da Capitania de Pernambuco como um sistema de informação que foi instituído em todas as possessões do Império Português, tendo em vista o desenvolvimento de unidades administrativas cada vez mais estruturadas em sectores orgânicos, com um estilo de processamento dos assuntos cada vez mais burocrático e em práticas fundamentadas por normas jurídicas. Estas, por sua vez, geraram uma quantidade enorme de informação escrita que necessitava também de um funcionário que coordenasse a criação, o trâmite e o armazenamento de toda a documentação produzida e recebida pelas entidades decisoras e implementadoras das políticas necessárias à administração da metrópole e da colónia.
Cabia, desta forma, a cada uma destas autoridades coloniais (governo, ouvidoria, provedoria, bispado, Câmaras, exército, etc.) manter e organizar os seus cartórios os quais por sua vez formavam sistemas de informações distintos. Para o governo das capitanias esta tarefa competia aos Secretários do Governo que ora temos como objecto de estudo.

A «fidalguia escravista» e a constituição do Estado Nacional Brasileiro (1831-1837)


Andréa Lisly Gonçalves
Universidade Federal de Ouro Preto


O processo de construção do Estado Nacional Brasileiro caracterizou-se pela disputa de diferentes grupos em torno de projectos políticos divergentes, quando não antagônicos. Ao longo do período Regencial (1831-1840), essas disputas assumiram a forma de revoltas que eclodiram nas diversas regiões do Brasil. Dentre os grupos que se destacaram, pelo menos um identificava-se ao Antigo Regime não apenas por lutar pela manutenção dos privilégios dos quais seus membros se diziam portadores enquanto fidalgos, mas também pela eleição da Câmara Municipal como lócus privilegiado de poder político, pela disposição em mobilizar os setores populares e os escravos através de revoltas de cunho regressista e por fim, pelo menos no caso das lideranças mais expressivas, por ocuparem postos característicos da nobreza civil ou política, fosse nas Câmaras, fosse no comando das tropas auxiliares. Foi sobre a actuação desse grupo na Província de Minas Gerais que versou minha pesquisa de Pós-Doutorado em História (Universidade de São Paulo USP), desenvolvida no ano de 2004, cujas conclusões pretendo apresentar nesta comunicação

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