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José Maria Vieira Mendes | ||||||||||||||||
“T1” CHICO Posso ficar cá hoje a dormir? ALBERTO O quê? CHICO É preciso a gente mexer-se. Ir aos sítios. É preciso sair, passear, sair, conversar com as pessoas certas da maneira certa. A entender é que a gente se fala. Posso? ALBERTO Podes ficar, podes. CHICO (fecha a porta da rua e deita-se no sofá) É que gosto de aqui estar. Gosto de ti. Gosto deste sofá. Qualquer dia fico a gostar mais desta casa que da minha. Deve ser do cheiro. ALBERTO Qual cheiro? CHICO A minha casa fala. Aqui não se ouve nada. A minha casa desapareceu. A minha casa fugiu. Agarrou nas coisas e pôs-se a andar. Desapareceu. Eu devia fazer o mesmo. Olha, conheci a Sara. Não tá mal. ALBERTO Tu agora és guarda-nocturno? CHICO Já me despedi. Antes sequer de ser admitido. Por mim. ALBERTO Foi rápido. CHICO (sentando-se) Foi uma experiência. É o que as pessoas dizem: Valeu a pena porque foi uma experiência. A experiência de ter sido despedido por mim próprio antes de me admitir a mim próprio. E tudo antes de sequer acontecer. E tudo dentro deste círculo que começa em mim, passa por mim e acaba em mim. Hã? ALBERTO Grande Experiência. CHICO As coisas estão a endireitar. in se o mundo não fosse assim |
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n. 1976 Portugal | ||||||||||||||||
© Instituto Camões, 2007 | ||||||||||||||||