Carolina Wilhelma Michaëlis de Vasconcelos
(Berlim, 15-03-1851 - Porto, 22-10-1925) |
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Carolina Michaëlis de Vasconcelos e netos [Lusitania, fasc. 10, 1927]
"Em cima da minha mesa de escrever está um retrato, ou melhor, um grupo, representando uma senhora sentada, cujos braços enlaçam amorosa e triumphantemente dois interessantes meninos, em pé e meigamente encostados aos joelhos da avósinha, que parece mãe d'elles: - é D. Carolina Michaëlis de Vasconcellos com os netinhos. É ella tal e qual; é tanto ella que á vista d'este retrato custa-me imaginá-la com o seu capello de doutora, a cabeça inclinada sobre algum manuscripto de passados seculos, o olhar escrutinador investigando a sua autenticidade" (Luise Ey, p. 231)
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Como se vê, esta filóloga - portuguesa, por casamento e por devoção - nasceu na Alemanha. Tendo estudado num colégio, e depois em casa com professor particular, o romanista Goldbeck, Carolina Michaëlis já aos 16 anos publicava uma recensão a Adolfo Mussafia ("Altspanische Prosadarstellung der Crescentiasage von A. Mussafia - Wien, 1866", Archiv für das Studium der neueren Sprachen und Litteraturen, 41, 1867, pp. 106-112); antes dos vinte, uma edição do Romancero do Cid (Leipzig, 1871); um ano passado entra como intérprete do Ministério do Interior alemão para os assuntos da Península Ibérica. Da deriva do interesse pela cultura hispânica para temas mais especificamente portugueses resulta conhecer Joaquim de Vasconcelos - musicólogo, historiador de arte, que estudara na Alemanha e que, por aquela altura, ao lado de Antero e de Adolfo Coelho, se houvera contra Castilho na polémica da tradução do Fausto ("Alguns artigos que publicou sobre litteratura portuguesa foram attraindo a attenção de um grupo de jovens patriotas que, em caloroso enthusiasmo, exprimiram a sua admiração e gratidão á novel auctora"); com Joaquim se casaria Carolina em Berlim, em 1876. Chegou nesse ano ao Porto, mas em 1877 estará uns meses na Biblioteca da Ajuda, "meses felizes e saudosos", a "decifrar e copiar, com paixão e paciéncia, essas pájinas seis vezes seculares", ou seja, o Cancioneiro da Ajuda. Os trabalhos de edição do Cancioneiro demorariam a completar-se 27 anos (publicação dos dois volumes de edição crítica e comentada em 1904, em Halle; para não contar com glossário: Revista Lusitana, 23, 1920, pp. 1-95), ilustrando bem características de D. Carolina, "pesquisa dos materiais, levada até ao extremo", "tratamento completo de todos os dados disponíveis conducentes à solidez e à validade das teses" (Maria Ana Ramos, "Palavras entre filólogos: uma carta de Leite de Vasconcellos a Carolina Michaëlis", Estudos Portugueses. Homenagem a Luciana Stegagno Picchio, 1991, pp. 143-158, p. 135)"). Em 1911, convidada para professora da Faculdade de Letras de Lisboa, transfere-se para a Universidade de Coimbra, onde lhe era mais fácil leccionar mantendo residência no Porto. No mesmo ano é eleita para a Academia das Ciências, o que, por se tratar de mulher, ainda foi objecto de discussões e melindres. (Sobre a maneira de ser de Carolina Michaëlis, veja-se o artigo de Luise Ey, sua amiga, "Dona Carolina Michaëlis na intimidade", Boletim da Segunda Classe..., pp. 231-245; um exemplo só: "Lembra-me uma famosa pesca no porto de Leixões, onde D, Carolina apanhou á isca um polvo enorme que ao jantar fez a delicia do esposo".)
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Carolina Michaëlis em 1876, à época do seu casamento [Lusitania, fasc. 10, 1927]
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Não é possível reportar-se aqui nem o essencial da sua produção nas áreas camoniana, vicentina, mirandina, bernardina, da romancística e, claro, da lírica trovadoresca, enfim todos os seus contributos para o conhecimento da literatura medieval e clássica - vejam-se a bibliografia que abre a Miscelânea de estudos em honra de D. Carolina Michaëlis de Vasconcellos, professora da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (Coimbra, 1933), ou, para síntese, o verbete sobre a filóloga no Dicionário da Literatura Medieval Galega e Portuguesa (organizado por G. Lanciani e G. Tavani; Lisboa, 1993). E também não mencionaremos a bibliografia de um seu campo de acção secundário, os estudos etnográficos - veja-se uma lista de trabalhos etnográficos em José Leite de Vasconcelos, Etnografia Portuguesa. Tentame de sistematização, 1, Lisboa, 1933, p. 275. Mesmo assim, a edição do Cancioneiro da Ajuda (Halle, 1904, 2 volumes; há desses dois volumes e do glossário saído em 1920 recente reimpressão, precedida de prefácio por Ivo Castro: Lisboa, 1990, 2 volumes), a que com justiça se costuma acrescentar o epíteto "monumental", é adequado interface até chegarmos à bibliografia mais marcadamente linguística. Outras investigações etimológicas estão disseminadas nos ensaios sobre literatura (por exemplo, "Mestre Giraldo e os seus tratados de alveitaria e cetraria", Revista Lusitana, 23 (3-4), 1910; o volume 2 dos Dispersos publicados pela Revista de Portugal - série A - Língua Portuguesa colige outros artigos de âmbito linguístico). No verbete que lhe dedica no Dicionário da Literatura Medieval Galega e Portuguesa, Ramón Lorenzo arrola como obra "linguística" mais conhecida as Lições de Filologia Portuguesa segundo as Prelecções feitas aos cursos de 1911-12 e de 1912-1913, seguidas das Lições Práticas de Português Arcaico (edição da Revista de Portugal: 1946 [circula reimpressão da Dinalivro, sem data]; tenha-se em conta porém que não é obra que D. Carolina tivesse preparado para publicação e que, como sebenta que era, deve ser das que mais se ressentem da passagem de quase um século); lembra também os artigos sobre infinitivo ("Der portugiesische Infinitiv", Romanische Forschungen, 7, 1893, pp. 49-122), sobre colocação do adjectivo ("Duas palavras sôbre a collocação do adjectivo em português", Revista Lusitana, 3, 1895, pp. 84-86), sobre a metafonia, a história do "l" e do "n", supletivismo no português ("Inéditos de D. Carolina Michaëlis", Revista Lusitana, 28, 1930, pp. 16-41); juntar-lhe-íamos ainda os artigos sobre a Cartilha maternal de João de Deus ("A cartilha portugueza e em especial a do Snr. João de Deus", O Ensino, 1, 1877, pp. 9-15, 17-19, 33-39). Sobre Carolina Michaëlis, além da bibliografia em periódicos de homenagem (Lusitania, fasc. 10, 1927; Boletim da Segunda Classe [da Academia das Ciências], Actas e Pareceres. Estudos, Documentos e Notícias, 5 (1911), Coimbra, 1912) ou em enciclopédias, há opúsculo acessível, O essencial sobre Carolina Michaëlis de Vasconcelos (por Maria Assunção Pinto Correia; Lisboa, 1986).
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